Consulente questiona sobre possível “alta administrativa” (equivalente alta a pedido) e procedimentos propostos em sua instituição.
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul tem as seguintes considerações em relação a “altas a pedido”:
a) A alta hospitalar é um ato médico no qual o médico assume a responsabilidade no que se refere ao tratamento proposto e, considerando os cuidados para possíveis complicações, responde por tal ato (arts. 1º, 3º e 4º do Código de Ética Médica (CEM – Resolução CFM 1931 de 17 de setembro de 2009);
b) O CEM destaca em vários artigos (22, 24 e 31) o respeito ao direito do paciente de escolher livremente sobre práticas diagnósticas e terapêuticas, salvo em caso de risco iminente de morte;
c) Entende-se como um direito do paciente recusar o tratamento proposto e mesmo pedir alta hospitalar, se for o caso. Entretanto, o ato da alta continua sendo um ato médico. Este não é obrigado a aceitar o pedido do paciente e/ou familiares ou responsáveis (princípio da autonomia). Nesse caso, a alta, se efetivada, se configura como um ato administrativo do hospital;
d) No caso de menores de idade ou adultos incapazes é dever do médico desenvolver todos os esforços no sentido de obter o melhor tratamento ao seu alcance em favor do paciente (art 32 do CEM e em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente).
Havendo discordância com a família ou responsáveis por crianças internadas no que se refere à continuidade de tratamento hospitalar, o médico convicto dos benefícios do tratamento para esse menor deve acionar o departamento jurídico do hospital para que tome as devidas providências junto ao Conselho Tutelar e Ministério Público visando garantir o respeito e a defesa dos melhores interesses dessa criança ou adolescente.
e) O Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu a Resolução 2057/2013 que trata, em seu capítulo XII, nos Art. 29, 30 e 31, das internações psiquiátricas:
“Art. 29. A internação de paciente em estabelecimento hospitalar ou de assistência psiquiátrica deve ocorrer mediante nota de internação circunstanciada que exponha sua motivação, podendo ser classificada, nos termos da lei 10.216/01 como voluntária, involuntária e compulsória.
§ 1º Internação voluntária é a que se dá com o consentimento expresso e por escrito de paciente em condições psíquicas de manifestação válida de vontade.
§ 2º Internação involuntária é a que se dá contrariamente à vontade do paciente, sem o seu consentimento expresso ou com consentimento inválido. Para que ocorra, faz-se necessária a concordância de representante legal, exceto nas situações de emergência médica.
§ 3º Internação compulsória é a determinada por magistrado.
Art. 30. Todo paciente admitido voluntariamente tem o direito de solicitar sua alta ao médico assistente a qualquer momento.
Parágrafo único. Se houver contraindicação clinica para a alta e presentes os requisitos que autorizam a internação involuntária, o medico assistente deve converter a internação voluntária em involuntária, nos termos da lei no. 10.216/01.
Art. 31. O paciente com doença mental somente poderá ser internado involuntariamente se, em função de sua doença, apresentar uma das seguintes condições, inclusive para aquelas situações definidas como emergência médica:
I. incapacidade grave de autocuidados;
II. risco de vida ou de prejuízos graves à saúde;
III. risco de autoagressão ou de heteroagressão;
IV. risco de prejuízo moral ou patrimonial;
V. risco de agressão à ordem pública.
Parágrafo 1o. O risco à vida ou à saúde compreende incapacidade grave de autocuidados, grave síndrome de abstinência a substância psicoativa, intoxicação intensa por substância psicoativa e/ou grave quadro de dependência química.“
Observe-se que o risco de autoagressão constante no art. 31, item III, inclui o risco de suicídio, quadro de alta gravidade por colocar o paciente em iminente perigo de vida.
Cabe salientar o disposto na lei no.10216/01 em relação à conversão de internação voluntária em involuntária e sobre a alta, em seu Art. 8o :
§ 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta.
§ 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento.
CONCLUSÃO:
Do acima exposto entendemos que inexiste a possibilidade do médico firmar a “alta a pedido”. Pacientes adultos capazes que recusam o tratamento hospitalar têm o direito de solicitar alta administrativa assumindo todos os riscos por tal ato. No caso de adultos incapazes e crianças ou adolescentes é dever do médico seguindo o principio de beneficência garantir o tratamento para seu paciente, acionando para tal fim o Conselho Tutelar e Ministério Público.