O CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL no uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei Federal n. 3.268, de 30 de setembro de 1957, alterada pela Lei Federal nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, regulamentada pelo Decreto n. 44.045, de 19 de julho de 1958, alterado pelo Decreto n. 6.821, de 14 de abril de 2009, e
CONSIDERANDO que o médico deverá atuar com autonomia, sem renunciar à liberdade profissional, auxiliando o paciente no processo de tomada de decisões de acordo com os ditames de sua consciência, observando as previsões legais e os procedimentos diagnósticos e terapêuticos (Capítulo, I, incisos VII, VIII e XXI do CEM);
CONSIDERANDO que o médico pode se recusar a praticar atos médicos com os quais não concorda, ressalvados os casos de risco de morte do paciente;
CONSIDERANDO que é vedado ao médico permitir que interesses de terceiros interfiram na escolha dos melhores meios de prevenção, diagnóstico ou tratamento disponíveis e cientificamente reconhecidos no interesse da saúde do paciente ou da sociedade (Art. 20, do CEM);
CONSIDERANDO que é vedado ao médico deixar de utilizar todos os meios científicos disponíveis à realização de diagnóstico e tratamento deste (Artigo 32, do CEM);
CONSIDERANDO o disposto na Resolução CFM nº 2.144/2016;
CONSIDERANDO que a assistência ao parto, ao puerpério e ao neonato é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde, conforme disposto no artigo 3º, a Lei nº 9.263/1996, que trata do planejamento familiar;
CONSIDERANDO o Parecer CFM nº 32/2018;
CONSIDERANDO, finalmente, a aprovação em sessão plenária realizada em 12/12/2019.
RESOLVE:
Art. 1º É vedado ao médico aderir e/ou subscrever documentos que restrinjam ou impeçam sua atuação profissional, em especial nos casos de potencial desfecho desfavorável materno e/ou fetal.
Art. 2º A vedação contida no art. 1º não abrange as demais medidas sugeridas pela paciente no que se refere à ambiência, autorização para participação como espectador do parto, dentre outras que não se relacionem com a prática do ato médico.
Art. 3º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA RESOLUÇÃO CREMERS Nº 04/2019
Os crescentes modismos verificados na Assistência Obstétrica nos últimos anos são deletérios à boa prática médica e colocam em risco a gestante e o concepto, além de interferirem de forma perigosa no Ato Médico. Esta situação se tornou tão grave que, atualmente, muitas vezes, quem decide os procedimentos a serem seguidos pelos obstetras são pessoas sem preparo para tomar decisões técnicas.
Esse panorama se tornou um verdadeiro suplício para médicos que ficam temerosos de serem processados caso não sigam estas orientações, muitas delas sem fundamento científico.
O trabalho de parto e o parto são situações permanentes de risco de morte. A mulher somente por estar grávida tem risco muitas vezes maior de morrer do que uma mulher não grávida, sendo o parto o ápice deste risco. Não é à toa que a morte no parto era uma das principais causas de óbito até tempos passados, fato este que precipitou, por exemplo, o incremento de plantões obstétricos composto por médicos obstetras presentes ao invés de somente parteiras. Estas tiveram seu momento na história. Com a qualificação do plantão composto por médico especialista, a morbimortalidade materno-fetal diminuiu drasticamente.
A pressão exercida por leigos e por modismos tem como consequência impedir a realização de procedimentos necessários e cientificamente validados e, com isso, restringir o papel do médico. Ao fim e ao cabo, o resultado disso é o abandono da obstetrícia por médicos competentes que não aceitam se submeter a isso. Vê-se maternidades públicas tomadas por pessoas sem qualificação com o objetivo de baratear a assistência em demérito da qualidade.
Um outro meio idealizado para pressionar o obstetra, é o chamado PLANO DE PARTO. Este documento apresenta uma série de normas exigidas pela gestante, ou feitas em conjunto com outra pessoa. Estas normas são retiradas de modelos disponíveis em sítios eletrônicos e determinam o que o médico pode ou não pode fazer por ocasião da assistência ao parto.
A negação do médico em assinar este documento pode causar inúmeros problemas para o profissional, inclusive sendo passível de ser denunciado por “violência obstétrica”, outro termo inventado para difamar médicos, dando a impressão que as ditas violências que as gestantes sofrem são por culpa dos obstetras.
É obrigação do obstetra estar atualizado sobre as melhores evidências médicas. A episiotomia é recomendada somente em casos selecionados, evitando, quando bem empregada, lacerações perineais com sequelas permanentes. A cesariana tem diversas indicações relativas e absolutas e o Guideline de 2019 do American College of Obstetricians and Gynecologists – ACOG – mostrou que, no atual nível de conhecimento, não se pode dizer que há uma via de parto mais segura. É desprovido de evidência científica que o parto vaginal é melhor do que a cesariana em situações em que não haja indicação de cesariana. A Resolução CFM nº 2.144/2016 libera a cesariana a pedido materno quando a gestação tem mais de 39 semanas. Importante, também, é sempre orientar a mulher que deseja uma prole maior, a preferir o parto vaginal e, mais importante ainda, a mulher que manifesta seu desejo de tentar o parto vaginal, deve ter esta vontade respeitada, desde que não haja contraindicação formal para o parto.
É oportuno lembrar que os tratamentos de saúde geram obrigação de meio, não de resultado. A banalização de processos contra médicos e profissionais da saúde tem algumas razões. Uma delas é a confusão conceitual que existe entre erro médico e mau resultado. A insatisfação decorrente de um tratamento, por si só, não gera responsabilidade. Em outras palavras, o profissional deve atuar eticamente da melhor forma para melhorar a saúde de seu paciente, observando critérios técnicos e boa relação médico-paciente, evitando a imposição de barreiras.
A gestante deve ser instruída na assistência pré-natal e sua autonomia pode e deve ser respeitada, mas jamais trazer riscos ao binômio materno-fetal. Quem tem o conhecimento e a experiência para tal é o médico especialista que foi forjado ao longo de muitos anos de estudo e prática cirúrgica. Isto o qualifica como o principal detentor do conhecimento científico e habilidade, capaz de minimizar as possíveis complicações que outrora ocorriam.
O CREMERS corrobora na íntegra com a Resolução do CREMERJ número 293/2019