“Violência Obstétrica” x Parto Adequado é o tema do artigo do médico obstetra Edson Vieira da Cunha Filho publicado nesta sexta-feira (18) na página 23 do jornal Zero Hora. Confira o texto na íntegra.
Violência obstétrica x parto adequado
O termo violência obstétrica tem sido alvo de discussões. Gostaria de tentar, como obstetra, pai e amigo de meus pacientes, justificar algumas medidas, que precisam ser contextualizadas, para que os casais possam ser tratados com ética, respeito e com embasamento científico.
O termo é chocante. Soa mal. Desrespeito e maus-tratos sempre devem ser combatidos. Mas é quanto ao termo. Nunca ouvimos falar sobre violência cardíaca, neurológica, dentística, advocatícia… É um problema de semântica, não sei. É ofensivo. E muitas das práticas condenadas com o termo, sempre foram praticadas porque existia uma razão científica.
Lemos matérias a respeito do tema com pouquíssima participação de obstetras. Quando queremos saber sobre leis, falamos com juristas, sobre crime, com a polícia. Entretanto, sobre violência obstétrica, vemos vários apontamentos de profissionais de outras áreas, mas de obstetras, quase nenhum. Por quê?
No Brasil, a taxa de cesarianas é cerca de 50%, com sua frequência aumentando no mundo. Segundo a OMS, suas taxas poderão chegar em 2030 a 63% na Ásia Oriental, 54% na América Latina (não exclusivamente Brasil) e 47% no sul da Europa. A episiotomia, que era defendida como rotina na maioria dos partos (para proteção materna e fetal), teve suas taxas reduzidas drasticamente (de 69% para 15% nos EUA e 12% em locais do RS em 2019). Entretanto, sua redução foi associada ao aumento de lesões graves no períneo, sendo por isso necessária e, atualmente, recomendada, em algumas situações seletivas (10%, 15% dos partos). E assim, várias práticas de preparo e manejo da mãe e do bebê (raspagem de pelos, golden hour…) foram se aprimorando com o evoluir da ciência, mas nunca foram praticadas com o intuito de agressão e, sim, na tentativa de melhor assistência.
É inadmissível que no século 21, onde a liberdade e a igualdade deveriam ser imperativos morais e sociais, tenhamos que discutir algo relacionado à violência. Entretanto, é iminente que os termos utilizados de uma maneira ofensiva não envolvam algumas práticas que, cientificamente, possuem aplicabilidade e que, durante nove meses de pré-natal, deveriam ser amplamente abordadas, fortalecendo a confiança e a relação médico-paciente para que o parto fosse coberto somente pelo brilho que ele merece.
Obstetra, PhD em ciências da saúde, chefe do Serviço de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital Moinhos de Vento
EDSON VIEIRA DA CUNHA FILHO